A impressão que eu tenho é que ter enfiado a cabeça até o fundo me possibilita ver a superfície de um outro jeito. Entendi só agora o que eu quero com a casa e com o projeto. Demorou dois anos, intensos anos, depois que a reforma ficou pronta pra eu entender o que eu posso ter nas mãos. Alargar os limites, radicalizar, colocar um monte de gente diferente morando juntas, friccionar até sair faíscas e pegar fogo, e torcer para o fogo não consumir tudo. Assim foi o ano que passou. a questão é que controlar o fogo é impossível, controlar os acontecimentos ou as consequências das relações é algo exaustivo e frustrante sempre. Você pode tentar uma guiança, inspirar pessoas, amortecer as quedas, cuidar das feridas, mas não controlar.
Ontem perguntei se ela achava que valia a pena esse meu esforço insano de criar aproximações entre pessoas diferentes, ela falou “sim”, mas pensou, fez uma pausa e balançou a cabeça enquanto falava.
Qual a importância disso? Aproximar, olhar e entender o mundo que não é o seu, amolecer fronteiras.
Falei que gostaria que me apresentassem as pessoas que fossem usar da minha casa e ela falou que uma apresentação formal não é algo comum de se fazer dentro do cotidiano dela e entre amigos. Aí falei que minha proposta é essa, que a pessoa adentre meu íntimo, minha casa, e, portanto, me conhecer ou criar um movimento para isso era algo indispensável para começar essa experiência... entendi então que precisamos criar outros rituais, que façam sentido para todo mundo.
É por isso que tudo dói tanto, todos adentram uma intimidade muito profunda nossa. a casa onde moro, onde crio meus filhos. aqui eu me exponho e me entrego e me dou do avesso, nada a esconder. por isso é tão fácil machucar.
Acho que o que me adoeceu foi ter perdido a casa, dentro de mil demandas e histórias que circulavam dentro dela. Não, perder a casa não!! Perder a guiança e o prazer de estar dentro deste território seria perder a vida. Nada importa tanto para mim quanto isso.
